Faz 46 anos que o Vasco dividia Rio-São Paulo com três clubes
O Vasco era um time sem grandes estrelas, mas muito bem organizado pelo técnico Zezé Moreira.
Como é que se comemora um título dividido por quatro? Foi nessa insólita situação que se encontraram corintianos, vascaínos, santistas e botafoguenses no fim de março de 1966, ao final da disputa do Torneio Rio-São Paulo daquele ano. As quatro equipes terminaram a competição empatadas com 11 pontos e foram declaradas campeãs por falta de datas para um tira-teima. Mas como foi que o quarteto alvinegro chegou a este empate inédito?
O TORNEIO
O Vasco de 1966. Em pé: Amauri, Joel, Brito, Maranhão, Fontana e Oldair. Agachados: Luisinho, Lorico, Célio, Danilo Meneses e Tião.
Organizado pelas Federações carioca e paulista, com o aval da Confederação Brasileira de Desportos (CBD, antecessora da CBF), o Rio-São Paulo voltava a ter um regulamento mais simples em relação ao de 1965, quando as equipes foram divididas em grupos e disputaram duas fases. Os cinco clubes da Guanabara (Fla, Flu, Vasco, Botafogo e Bangu – que substituía o America) e os de São Paulo (Corinthians, Palmeiras, São Paulo, Santos e Portuguesa) jogariam todos contra todos, em turno único. O time que somasse mais pontos levaria o troféu.
No entanto, incrivelmente, escapava à ideia dos cartolas de então a necessidade de se criar critérios de desempate, sem que fossem necessárias partidas extras. Afinal, ainda estava fresca na memória dos torcedores a decisão do mesmo torneio dois anos antes, quando Santos e Botafogo dividiram o caneco também por falta de datas depois de já terem jogado a primeira partida.
O Santos de 1966. em pé: Lima, Zito, Geraldino, Joel Camargo, Mauro e Laércio. Agachados: Peixinho, Mengálvio, Toninho Guerreiro, Pelé e Pepe.
O torneio teve início no dia 9 de fevereiro, com um duelo tricolor: o São Paulo bateu o Fluminense por 3 a 1 em São Januário, diante de apenas 2.552 torcedores. Só mesmo lá pelo final daquele mês é que a competição cairia no gosto do público.
Na véspera da primeira partida, a CBD havia anunciado o calendário da preparação da Seleção Brasileira visando ao Mundial da Inglaterra. Àquela altura, o Brasil era o único dos 16 participantes sem ter um grupo regular de jogadores convocados ou sequer um time-base. Segundo a entidade que dirigia o futebol no país, o torneio seria tomado como base para observações dos futuros convocados. E havia muitas atrações a observar.
O Corinthians de 1966. Em pé: Jair Marinho, Dino Sani, Galhardo, Ditão, Édson e Heitor. Agachados: Garrincha, Nair, Flávio, Tales e Gilson Porto.
OS DESTAQUES
A maior delas era a contratação mais bombástica daquele início de ano: Garrincha no Corinthians. Mas Mané já não era o mesmo de quatro anos antes, e estrearia no alvinegro de Parque São Jorge com atuação catastrófica diante do Vasco, que venceu por 3 a 0 em pleno Pacaembu. Mas, levado pelos gols do artilheiro Flávio e revelando um garoto de gênio forte chamado Rivelino, o Timão reagiria.
Já o Vasco era um time sem grandes estrelas, mas muito bem organizado pelo técnico Zezé Moreira. Tinha uma defesa firme liderada por Brito, o talento do uruguaio Danilo Menezes no meio e o faro de gols de Célio na frente. Entre os demais rivais do Rio, o Botafogo trazia como maior reforço o goleador Parada, contratado a peso de ouro do Bangu para se juntar a Jairzinho, Gérson e outros craques.
O Botafogo de 1966. Em pé: Joel, Nei Conceição, Manga, Zé Carlos, Dimas e Moreira. Agachados: Jairzinho, Gérson, Sicupira, Fifi e Waldir.
O Flamengo, que havia acabado de conquistar o título carioca de 1965, contava com a dupla Silva “Batuta” e Almir “Pernambuquinho”, e revelava um jovem goleador: César Lemos, o futuro “Maluco” do Palmeiras, mas teve altos e baixos ao longo da competição. O mesmo aconteceu com o vice carioca, o Bangu de Roberto Pinto e Paulo Borges, mas sem seu artilheiro Parada. Já o Flu de Altair e Amoroso vivia fase de transição e corria por fora.
Entre os paulistas, havia o favorito de sempre: o Santos. Mesmo sem contar em nenhuma partida com o poupado Pelé, trazia um elenco invejável, que mesclava os já experientes Dorval, Zito, Mengálvio, Coutinho, Del Vecchio e Pepe aos jovens Carlos Alberto Torres, Joel Camargo e Edu. E ainda havia um artilheiro valente e brigador para vestir a 10, Toninho Guerreiro.
A “Academia” palmeirense de Ademir da Guia também reunia um grande elenco em quantidade e qualidade, mas a irregularidade da campanha (quatro vitórias para o mesmo número de derrotas, e apenas um empate) acabou tirando o time da briga: o Alviverde caiu diante do São Paulo por 4 a 2 um dia antes dos demais jogos da rodada decisiva.
O Tricolor – do já veterano Bellini e de Roberto Dias, Fefeu e Paraná – chegou à última partida já sem chances, mas, ironicamente, ficou a um ponto dos campeões, enquanto a Portuguesa – do goleiro Félix e de Ivair, o “Príncipe” – se encarregou de segurar a lanterna.
A ÚLTIMA RODADA
No dia 27 de março, os quatro postulantes ao título entraram em campo nas seguintes condições: o Vasco era o líder com 11 pontos, seguido por Santos e Corinthians, ambos com um a menos, ao lado do São Paulo, que já havia encerrado sua participação. O Botafogo vinha mais atrás, com nove, mesma soma do já eliminado Palmeiras. E, curiosamente, os alvinegros se enfrentariam.
No Pacaembu, em jogo bastante tumultuado, Timão e Peixe ficaram no 0 a 0, mas não faltou polêmica e emoção. Os santistas Coutinho e Mengálvio foram expulsos ainda no primeiro tempo, e o Corinthians teve a chance da vitória em pênalti de Zito em Garrincha, mas Laércio defendeu a cobrança de Flávio.
Empatados na tabela, os rivais paulistas aguardaram notícias do Maracanã, onde Vasco e Botafogo entraram em campo um pouco mais tarde, já que a partida entre Fluminense e Bangu, que seria jogada na véspera, foi cancelada em virtude de um temporal e transferida para a preliminar do outro clássico.
Assim, os Cruz-Maltinos precisavam de um empate para levantarem o título sozinhos, mas quando enfim souberam disso, não podiam fazer mais nada: o Botafogo já vencia por 3 a 0 com dois de Jairzinho e um de Parada, que se sagrou artilheiro do torneio, com oito gols. E aí embolou geral.
E SE HOUVESSE DESEMPATE?
E o que aconteceu após o incrível quádruplo empate? Nada. Os jornais da época noticiaram o título dividido por quatro como nota de pé de página. Afinal o grande assunto do dia era o listão de 45 (!!!) jogadores convocados para o período de treinamentos visando à Copa do Mundo. Mas, e se houvesse desempate? Esgotando todas as possibilidades, pode-se dizer que o título ficaria no Rio.
Se levássemos em conta em primeiro lugar o número de vitórias, Vasco e Corinthians sairiam na frente, com cinco, contra quatro de Botafogo e Santos. E o Cruz-Maltino levaria vantagem em relação ao Timão no saldo de gols (+1 contra zero). Mas se a diferença entre tentos marcados e sofridos fosse o critério principal, o título iria para General Severiano (oito, contra sete do time da Vila Belmiro).
O Botafogo também levaria a taça se o confronto direto entre os quatro clubes durante o turno fosse usado como critério. Num hipotético quadrangular, o time da Estrela Solitária teria somado duas vitórias (5 a 1 sobre o Corinthians e os 3 a 0 no Vasco da última rodada) e um empate (1 a 1 com o Santos) – ressalte-se que jogando sempre no Maracanã. Neste caso, o Peixe seria o vice, com uma vitória (5 a 2 sobre os Cruz-Maltinos) e dois empates.
Como se vê, opções de critérios não faltaram. Craques em campo em todos os clubes (que reuniam 41 dos 45 convocados), também não. Mas organização por parte dos cartolas, que era (e é) bom…
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