Fabiano Eller relembra falta que resultou no gol de Pet em 2001

Dez anos depois, o gol de falta de Pet aos 43 minutos do segundo tempo ainda confunde a cabeça Fabiano Eller.

Fabiano Eller fez a falta em Edílson. Mas o jogador garante que não cometeu a infração. Pouco depois, admite que teve que parar o atacante do Flamengo. Dez anos depois, o gol de falta de Pet aos 43 minutos do segundo tempo ainda confunde a cabeça do zagueiro.
Mas, entre dúvidas, algumas certezas daquele dia 27 de maio de 2001. Na hora que viu a bola entrar no ângulo esquerdo de Helton, Eller sentiu vontade de chorar, diz que o coração doeu e as pernas pesaram.

O zagueiro recorda que foi barrado por Joel Santana logo na partida seguinte. Eller revela ainda o clima de abatimento e os desdobramentos causados pelo gol de falta do Pet.

– Acabou que tomei uma punição por esta derrota (risos). Fui barrado.

Colecionador de camisas de clubes, Eller diz que não sabe onde foi parar a camisa daquela final. E nem faz questão de saber. Questão ele faz de dividir responsabilidades pela derrota por 3 a 1 e a perda do título.

– Não fui o único culpado pela derrota, não joguei sozinho.

Confira abaixo a íntegra da entrevista com Fabiano Eller.

O que vem a sua cabeça quando lembra daquela final?

Foi muita tristeza, um desastre. Eu fiz a falta que ocasionou esse gol. Acho que o pessoal do Flamengo não lembra, mas os vascaínos devem lembrar. Na época, era um jogador novo. De repente, hoje, com a experiência, eu não faria aquela falta. Eu marcava o Edílson, que estava numa fase muito boa, já tinha feito dois gols naquela partida, corria e dava trabalho. A preocupação com ele era grande. O jogo estava nos minutos finais, se deixo o Edílson escapar, poderia acabar em gol. Lembro também que o Beto era quem batia as faltas dali, mas ele tinha acabado de sair. O Pet tem uma precisão grande quando a cobrança é mais perto. Mas do jeito que foi, com o Helton pulando do jeito que pulou, tinha que ser do Flamengo mesmo. Faltavam dois minutos para o fim da partida. Vendo o replay do lance, dá para perceber que, quando a barreira olhou para trás e viu a bola entrar, desmoronou, não tinha mais reação. Eu lembro que o Vasco teve muitas oportunidades de matar aquele jogo. Nosso time recuou muito, culpa mesmo dos jogadores, com medo de levar gol. O Flamengo começou a pressionar, ganhava por 2 a 1 e precisava fazer mais um gol. Ou eles faziam, como aconteceu, ou levavam. Com o gol do Pet, as forças do Flamengo que estavam se acabando dobraram, e as nossas acabaram. Quando tem que acontecer não tem jeito.

E o lance da falta em si?

O Edílson estava me segurando, normal, atacante faz isso. Ele se escorou em mim. Se fosse um jogador mais alto, talvez eu não encostasse tanto nele. Como ele é baixinho, encostei. O Edílson, na malandragem dele, também me segurou, pegou a bola e girou tocando. Como não ia ter mais jeito de seguir o lance, o Torres colocou a bola para fora, mas o juiz não deixou correr a jogada, voltou e marcou falta. Na minha opinião, não foi falta. Hoje, com experiência, não estaria tão encostado no jogador, mas ele também me segurou.

Todos os jogadores do Vasco que estavam na barreira viram de costas ao mesmo tempo, acompanham a bola e ficam atônitos quando ela estufa a rede. Qual a reação, o sentimento naquele exato momento?

Dá vontade de chorar, sério (risos). Todo mundo olhou a falta e quando a bola entrou ninguém acreditou, pois vimos o quanto o Helton pulou. Não tem outra explicação. Quando Deus quer, não tem jeito. Tudo aconteceu para o Flamengo ganhar esta partida. Onde a bola entrou, naquele pedacinho. Doeu o coração. Minhas pernas pesaram naquela hora, não tinha mais o que fazer. A partida praticamente tinha acabado, e nosso time estava muito concentrado, pois tínhamos a vantagem. Geralmente um vacilo acontece com quem tem vantagem e cria empolgação, euforia, quer armar festa, comemorar… O que complicou foi que levamos o primeiro gol muito cedo. Jogamos o tempo todo com receio de levar mais um.

Na trajetória da bola, deu para perceber que ela entraria?

Não. Impossível, pela distância que foi. A falta foi muito longe. Difícil acertar aquela falta, ainda mais colocado. Foi mérito do Pet, que é excelente cobrador de falta. A torcida do Flamengo já tinha praticamente desistido, ninguém confiava que o time ainda faria um gol. Nesse dia, Deus abençoou ainda mais o Pet.

O Eurico já estava no campo fumando charuto, a torcida preparava a festa… Como foi depois do jogo, o clima no vestiário, foi difícil dormir naquela noite?

Já ganhei muitos títulos, mas perdi algumas finais. Entramos no vestiário, cada um sentou para um lado, alguns jogadores ficaram na sala de aquecimento. Não tinha clima nem de um olhar para a cara do outro, não tem o que falar. Sempre aparecem pessoas que tentam passar ânimo, mas ali foi difícil. Todo mundo tinha esperança de que, com a vantagem no primeiro jogo, iríamos ganhar. Por isso, foi ainda mais um balde de água fria que caiu sobre todo mundo. No vestiário, sempre vem um bater na cabeça, mas o cara está tão mal que você nem vê quem está falando. Qualquer palavra para animar não adianta, não tem nada que faça o jogador ficar bem num momento como esse. Demoramos muito tempo para sair do Maracanã, sem acreditar no que aconteceu, com a torcida do Flamengo em massa comemorando. Foi um desastre. Tínhamos um timão, os nomes no papel eram melhores que os do Flamengo. A cobrança em cima de um time com jogadores experientes é maior. Mesmo com a experiência, a maioria não consegue esquecer esse jogo. Sempre entra na internet para dar uma olhadinha. Eu mesmo revejo o lance. Foi um drama para os vascaínos. E o torcedor não entende, pensa que apenas ele sofre, mas é mentira. Os jogadores sofrem muito, a família sofre junto. Jogador chega irritado em casa, quem está do lado sofre, filho, esposa. Para o torcedor, no dia seguinte tem aquela gozação de amigo, mas para o jogador fica marcado para sempre, são histórias construídas no futebol, com títulos e também com derrotas. Quando ganha é muito legal, entra no currículo, mas às vezes pode manchar a história de um jogador, que não vai fazer o mesmo sucesso.

Além de o Pet tirar o título do Vasco, causou estresse na família Eller?

Não deu nem para dormir. Uma partida como aquela, mesmo com vitória, jogador não dorme, pela pressão, adrenalina, perdendo então, pode ter certeza que não dorme. No futebol não existe o cara num caso como esse dizer que vai dormir tranquilo, pois fez a parte dele. Não tem um que diga isso.

E quais foram as consequências para você?

Um jogo como aquele pode afundar a carreira do jogador. Eu jogava no Vasco, ainda não tinha um nome, mesmo sendo titular, pouca gente me conhecia. Podia ter afundado a minha carreira a partir dali, não ter o sucesso que tive, ainda mais eu tendo a falta que ocasionou o gol. Mas, graças a Deus, dei a volta por cima, passei por grandes clubes. E tem que lembrar que participei de títulos importantes do Vasco, não pode lembrar só da tragédia. Cheguei ao Vasco em 95, me profissionalizei em 97, estava na conquista do Brasileiro (97), Libertadores, regionais, Mercosul.

Temeu ficar marcado para sempre?

Quando jogador dá entrevistas nem sempre fala todas as verdades, pois pode ficar queimado, manchar a carreira. Dez anos depois, posso falar abertamente, falo que eu fiz a falta, mas não quer dizer que fui o único culpado pela derrota, não joguei sozinho.

O que você pode falar do Pet como pessoa, jogador, cobrador de faltas?

Nunca joguei com ele, não tive contato pessoal, de conviver, apenas de escutar, jogar contra. Pelo que ele passava dentro de campo, ele é um cara chato. Mas é importante ter jogador chato no grupo, que cobra. O Pet era assim, cobrava, dava dura nos jogadores, chamava a responsabilidade. E exímio cobrador de faltas, escanteios. Quando o Pet jogava, pode ter certeza que os treinadores treinavam a colocação da barreira, a marcação nos lances de escanteio. Todos os times gostariam de ter um jogador como ele no elenco, pela liderança, qualidade técnica, por ser batedor de falta.

Dois anos depois daquele tricampeonato, você foi para o Flamengo. Quando chegou, ainda se falava do gol, do que ele representou?

Mais para os torcedores, título para jogador passa rápido. Você ganha um título no domingo e já tem outro jogo na quarta. Não tem como comemorar tanto tempo assim. Mas o torcedor até hoje fala e comemora.

O que você fez com a camisa da final de 2001?

Essa eu não guardei, tenho certeza. Tenho coleção de camisas, principalmente dos clubes onde passei. Essa não era uma recordação para guardar, não.

Os deuses do futebol agiram naquele 27 de maio de 2001?

(Pausa). Não acredito em deuses do futebol, apenas em um Deus. E Deus abençoa as pessoas pelo trabalho, pela busca, pelo que faz. A gente deixou de fazer algumas coisas. Muitas pessoas comentam: ‘Ah, tem gente que não merecia perder’. Já não consigo analisar. Tinha gente que realmente não merecia, mas outros mereciam. Não dá para analisar pelo lado espiritual do futebol.

E a beleza do gol?

Foi um gol extraordinário. Não queria ter tomado esse gol, mas hoje analisando e olhando, foi um gol perfeito. Já vi de vários ângulos. Foi um gol bonito na batida, como no pulo do Helton. Foi bonito. Entrou para a história pelo título e pela beleza. Perder é feio, seja com gol bonito, ou não. Quem leva sempre acha que é feio.

Sua carreira seguiu depois daquele gol, você conseguiu ter sucesso, mas teve algum desdobramento negativo?

As coisas foram trágicas. Fui titular da final, depois eu fui para o banco. Podem acontecer essas coisas. Não sei se ele (Joel Santana) quis me culpar pelo gol, mas depois de uma derrota acontecem muitas coisas. Quando o time ganha apaga muitos defeitos, coisas ruins dentro de campo. Quando perde aparecem as coisas erradas. De repente, se fossemos campeões, poderia ser diferente. Contra o Boca, pela Libertadores, eu já não joguei. Acabou que tomei uma punição por esta derrota (risos). Não pelo meu desempenho, mas pela derrota que foi cruel para a gente.

Fonte: globo esporte

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