Conheça a história de Nelson da Conceição, 1º goleiro negro do Vasco e da Seleção

Nascido em 12 de agosto de 1899, em Nova Friburgo, interior do RJ, Nelson da Conceição estreou pelo Vasco da Gama em 1919.

Nelson da Conceição, ídolo do Vasco
Nelson da Conceição, ídolo do Vasco

Um dos primeiros ídolos da história do Vasco, Nelson da Conceição também marcou seu nome na seleção brasileira em 1923, mesmo ano do primeiro título carioca do clube. Há 100 anos, no dia 11 de novembro, o Brasil enfrentava o Paraguai com o primeiro goleiro negro da história da Seleção.

A seleção brasileira de Pelé, o maior jogador brasileiro de todos os tempos, naquela época tinha poucos negros em seu plantel. Até a estreia de Nelson, todos os goleiros que haviam vestido a camisa da Seleção eram brancos. Mas era impossível ignorar a qualidade do jogador do Vasco, que, apesar do racismo que imperava no país, era o melhor da posição no Rio, então capital do Brasil.

Neste 20 de novembro, Dia da Consciência Negra, o ge se inspira na pesquisa do historiador Walmer Santana, intitulada ”As mãos negras do chauffeur Nelson da Conceição: futebol e racismo na cidade do Rio de Janeiro”, para contar a história de um dos Camisas Negras, lendário time do Vasco.

Quem foi Nelson da Conceição?

Nelson nasceu em 12 de agosto de 1899, na cidade de Nova Friburgo, interior do Rio de Janeiro. Mudou-se para a capital e começou a disputar partidas oficiais de futebol com apenas 15 anos. Iniciou a carreira em 1915, no Paladino Football Club, clube filiado à Liga Metropolitana de Sports Athleticos (LMSA). Em 1916 atuava pelo Engenho de Dentro Athletico Club, onde se tornou tricampeão da Liga Suburbana. Em 1919, foi contratado pelo Vasco.

– Ao chegar ao Vasco, Nelson era chofer de praça (taxista) no Engenho de Dentro, profissão proibida pela Liga Metropolitana. Jornais do Rio de Janeiro apontavam esse fato, denunciando sua condição, que aos olhos de parte da elite carioca era imoral para a prática do futebol na entidade mais rica que administrava esse esporte – contou o historiador Walmer Santana em entrevista ao ge.

– Há relatos do ex-jogador Paschoal, campeão com o Vasco em 1923, que os jogadores vascaínos eram insultados e agredidos com pedras porque havia negros na equipe. Mario Filho, na obra ”O Negro no Futebol Brasileiro”, também narra fatos ocorridos com Nelson a partir de 1925, quando o goleira era apedrejado por sócios dos clubes rivais nos jogos – completou.

Para ser aceito pela liga, Nelson precisou deixar a profissão de taxista. Com a ajuda do Vasco, o goleiro passou a trabalhar na Casa Alberto, comércio de chapelaria, que pertencia a um torcedor do clube.

Acima da média

Apesar de toda retaliação por parte principalmente de dirigentes e torcedores adversários e da própria imprensa, Nelson ”fugiu” do pedido de exclusão feito pela AMEA (Associação Metropolitana de Esportes Atléticos) e que resultou na famosa Resposta Histórica do Vasco em 1924.

Na época, a liga solicitou que o clube excluísse 12 atletas, negros e operários, do seu quadro para que continuasse a disputar o campeonato. O Vasco se recusou a atender o pedido e não disputou a competição em 1924. Nelson, no entanto, não estava incluso na lista. Por que?

– A diferença foi a qualidade excepcional dele como goleiro e ter conseguido mostrar isso nos principais palcos do Rio de Janeiro. Nelson já era um dos melhores goleiros do Rio de Janeiro em 1919, havia sido tricampeão da Liga Suburbana com o Engenho de Dentro – explicou Walmer.

– No Vasco, conseguiu levar seu futebol para a principal liga da então capital do Brasil e foi um jogador fundamental para a ascensão do clube à elite carioca e para as principais conquistas vascaínas. Em 1923, quando o Vasco foi campeão carioca, as atuações de Nelson foram decisivas, fato reproduzido por diversos jornais da época. Graças a essas atuações, Nelson foi convocado pela seleção brasileira. O título de 1923 coroou seu status de melhor goleiro do Rio de Janeiro – acrescentou o pesquisador.

Seleção brasileira

Em alta no Rio de Janeiro, como goleiro titular da seleção carioca, Nelson então chegou a seleção brasileira em 1923. Foi o goleiro do Brasil no Campeonato Sul-Americano, em que o time não foi bem. Por outro lado, conquistou a Taça Rodrigues Alves e a Taça Confraternidad Brasil-Argentina.

Nelson com a seleção brasileira:

  • 11/11/1923: Brasil 0x1 Paraguai – Campeonato Sul-Americano
  • 18/11/1923: Brasil 1×2 Argentina – Campeonato Sul-Americano
  • 22/11/1923: Brasil 2×0 Paraguai – Taça Rodrigues Alves
  • 25/11/1923: Brasil 1×2 Uruguai – Campeonato Sul-Americano
  • 28/11/1923: Brasil 9×0 Combinado de Durazno (Uruguai) – Amistoso
  • 02/12/1923: Brasil 2×0 Argentina – Taça Confraternidad Brasil-Argentina
  • 09/12/1923: Brasil 0x2 Argentina – Copa Roca

Reportagem do jornal ”O Paiz”, de 27 de novembro de 1923, destacou a boa atuação de Nelson pela seleção brasileira, apesar dos resultados ruins no Campeonato Sul-Americano:

”O triângulo brasileiro foi o melhor do campeonato: Dos quatro triângulos que participaram no 6º campeonato sulamericano, o melhor, segundo informações que recebemos de Montevidéo, foi o da equipe brasileira. Nelson Conceição, Sylvio Serpa (Allemão) e Orlando Pennaforte, constituíram o triangulo de ouro do certâmen de Montevidéo.

Em todos os tres matches, estes tres valorosos e destemidos jogadores brasileiros demonstraram o seu estupendo jogo, empolgando constantemente as grandes assistencias. A estes tres jogadores cariocas deve o quadro brasileiro não ter sido vencido por grandes scores.

Houve partidas em que os tres footballers brasileiros, sustentaram por 90 minutos de jogo, as fortes cargas dos adversários, mantendo ou obrigando a estes, um trabalho intenso, para a conquista de um goal. Ao triangulo de ouro do sul-americano os nossos parabéns”.

Ídolo do Vasco

Nelson da Conceição estreou pelo Vasco no dia 23 de março de 1919, na vitória de 1 a 0 sobre o River/RJ, pelo Torneio Início da 2ª Divisão da LMDT (Liga Metropolitana de Desportos Terrestres). A sua última partida pelo clube foi no dia 17 de julho de 1927, na vitória de 2 a 1 sobre o América do Rio, em jogo válido pelo Campeonato Carioca.

A pesquisa de Walmer Santana é fundamental para o conhecimento sobre um grande ídolo do Vasco em um contexto social que não favorecia a ascensão dos negros.

– Representa parte da história da ocupação pelos negros de espaços antes reservados apenas para brancos. Graças à sua qualidade técnica como jogador chegou ao posto de goleiro da seleção carioca e seleção brasileira. Nelson se enquadra na posição de ídolo histórico do Vasco, um dos maiores goleiros da história do clube. Representa o sucesso da política de assimilação de pessoas com status social de excluídas realizada pelo Vasco desde o Remo – destacou Walmer.

Mas, mesmo após o título de 1923 e a convocação para a seleção brasileira, Nelson não foi bem aceito pela sociedade carioca. No Campeonato Carioca de 1925, ainda sem São Januário, o Vasco optou por mandar seus jogos no Estádio das Laranjeiras.

– Em suas crônicas, Mario Filho relata que os torcedores e sócios do Fluminense iam para trás da baliza de Nelson para provocá-lo com insultos – pontuou Walmer em sua pesquisa.

O Vasco decidiu então jogar no campo do Flamengo, na Rua Paissandu: ”Além de desaforos, Nelson tinha de aturar as pedras que eram jogadas pelos sócios do Flamengo, que se agrupavam atrás dele”. Só quando o clube mudou para o campo do Andaray e permitiu apenas torcedores com a camisa vascaína atrás da meta defendida por Nelson, o goleiro teve paz. Ainda em 1925, ele ganhou a faixa de capitão do time, coroando seu prestígio na delegação.

Mesmo após deixar o Vasco, o goleiro seguiu como sócio do clube. No geral, Nelson da Conceição disputou 192 partidas pelo Vasco, com 123 vitórias, 27 empates e 42 derrotas. Nelson faleceu em 24 de abril de 1942 no Hospital Graffrée e Guinle, onde estava internado à custa do clube.

Fonte: Globo Esporte

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