Antônio Lopes relembra passagens pelo Vasco e briga entre Romário e Edmundo

Ex-técnico do Vasco da Gama, Antônio Lopes contou detalhes da sua passagem no Clube e conflito entre Romário e Edmundo.

Antônio Lopes com a taça da Libertadores conquistada pelo Vasco em 1998 no gramado de São Januário
Antônio Lopes com a taça da Libertadores conquistada pelo Vasco em 1998 no gramado de São Januário

Este é um dos meses mais especiais do vitorioso currículo de Antônio Lopes. O treinador, que acumulou seis passagens no comando do Vasco, conquistou em agosto de 1998 o título mais importante da história do clube, a Libertadores. Aos 83 anos, o “delegado” ainda carrega as memórias dos anos de glória e também os segredos que o fizeram levar seus times ao auge.

Criado na Zona Norte do Rio de Janeiro, onde tentou a carreira de jogador no Olaria e no Bonsucesso, Antônio Lopes emplacou no futebol só anos depois, quando começou a atuar como auxiliar técnico. Nesse período já havia ingressado na polícia como delegado, função na qual se aposentou e que exerceu paralelamente ao cargo de treinador.

– Polícia eu só tirava plantão, então quando eu estava de plantão eu não ia no futebol e vice-versa. Dava para conciliar perfeitamente. Foi até bom, sabe que jogador é fogo, né? Mas, por eu ser delegado, eles passaram a me respeitar mais, até os “bad boys”. Romário, Felipe, Edmundo… Comigo eles eram pianinho – recordou Antônio Lopes em conversa com o ge.

Romário e Edmundo “deram trabalho” para Antônio Lopes. A dupla de atacantes, que ele elege como a melhor que já treinou, protagonizou momentos polêmicos no Vasco. Os dois, que conviveram juntos em São Januário entre 1999 e 2000, eram desafetos declarados.

– Considero o Edmundo e o Romário os dois mais fora da curva. Os dois são fora de série. Eles jogaram comigo e foi tudo bem, foi o que eu falei para eles na época: “Dentro do clube vocês são amigos, lá fora o problema é de vocês, mas aqui não é para atrapalhar o futebol”. Cheguei a conversar com eles e os dois foram super bem comigo – afirmou o ex-técnico.

– Roberto (Dinamite) era um cara muito legal, muito amigo e jogava para cacete, não sei quem era melhor, ele ou Romário ou Edmundo. Ele fazia tudo, batia falta, pênalti, fazia tudo. Se tivesse que formar um time tendo os três, o meu ataque seria esse. Romário, Edmundo e Roberto – acrescentou quando perguntado se Dinamite também estava entre os melhores na visão dele.

Títulos de Lopes pelo Vasco:

  • Carioca (1982, 1998 e 2003)
  • Brasileiro (1997)
  • Libertadores (1998)
  • Torneio Rio- São Paulo (1999)

A esposa do treinador, Elza Lopes, teve papel importante na conquista daquela Libertadores. Ela participou ativamente do dia a dia do time em 1998, ajudando o marido com os atletas.

– Ela fazia muitas reuniões com as mulheres dos jogadores. Aí ela mostrava para elas como eu procedia e arrumava um jeito de as mulheres dos jogadores ficarem em cima deles também. Mais pelo comportamento deles. Muita gente achava que eu era duro de mais com os jogadores, e ela interferia, dizia que não era isso, que eu queria o bem deles – contou ele.

O ge pediu que Lopes montasse uma seleção com 11 jogadores com quem ele trabalhou no Vasco. O time escolhido foi o seguinte:

Carlos Germano, Vitor, Odvan, Mauro Galvão e Felipe; Luisinho Quintanilha, Pedrinho e Juninho Pernambucano; Edmundo, Romário e Roberto Dinamite.

A final da Libertadores de 1998 foi no dia 26 de agosto. No jogo de ida, no dia 12, em São Januário, o Vasco venceu o Barcelona-EQU por 2 a 0, com gols de Donizete e Luizão. Na volta, em Guayaquil, o time carioca voltou a vencer, por 2 a 1, com gols novamente de Luizão e Donizete, e De Ávila descontando para os equatorianos.

O ex-delegado recebeu a reportagem no prédio onde mora, na Zona Sul do Rio de Janeiro, pouco depois de ter caminhado 8 quilômetros pela orla – hábito sagrado na rotina de um profissional de Educação Física. Outro costume que Lopes mantém é o de assistir aos jogos de futebol, mas só os de times brasileiros e, principalmente, os do Vasco.

O papo durou cerca de uma hora e rendeu lembranças dos momentos vitoriosos da carreira, incluindo a passagem pela seleção brasileira em 2002, e comentários sobre o atual momento do Vasco e do futebol brasileiro.

Leia a entrevista completa abaixo:

A carreira curta como jogador e a decisão de dar início aos estudos

Fui ajudado pelo meu pai. Eu era garoto em Bonsucesso e jogava nos times de várzea. Eu não fui um grande jogador. Tinha uns 16 anos, fui jogar contra o Olaria em um time de várzea que eu jogava, e o técnico do Olaria gostou de mim e me chamou para eu treinar com eles. Fiquei um pouco lá e, ao mesmo tempo, eu estava estudando. Chegou um ponto que meu pai falou: “Olha, melhor você parar, não está indo bem na base, é melhor você estudar e mais à frente você tentar novamente, caso queira”.

Estava na época de prestar vestibular, meu pai queria que eu fizesse odontologia, queria ter um doutor na família, mas eu acabei não atendendo. Encontrei um rapaz do basquete do Olaria, ele me falou sobre o curso de Educação Física, que era legal. Ali começou a minha carreira no esporte, em vez de ser dentista, passei a estudar Educação Física naquela época.

Depois, fiz concurso para a polícia como detetive, estava naquela de futebol e polícia. Eu estava como detetive e pensei: “Não vou querer ser só detetive, vou ser delegado também”. Fiz o vestibular para Direito, passei e comecei a fazer o curso. Eu terminei e estava no futebol também, joguei Segunda Divisão na época, só treinava uma vez na semana, ganhava uma graninha e comecei a me virar. Depois passei a ser vendedor, fui fazendo de tudo. Fiz o concurso e passei para delegado.

Como o cargo na polícia o ajudou a voltar para o futebol

Eu trabalhava no Detran, e o Hélio Vigio foi lá para resolver um problema no carro do Andrada, um goleiro argentino que o Vasco tinha, que tinha sido apreendido. “Pô, Lopes, apreenderam o carro do Andrada, você pode ver?”, e eu consegui liberar. Ele já estava trabalhando no Vasco, sabia que eu era formado em Educação Física e me chamou. “Claro que eu quero”, falei. Naquela época era muito difícil de entrar no futebol, eu entrei e fui trabalhar no Vasco com ele. Continuei trabalhando na polícia também, fazendo as duas coisas juntas.

O título brasileiro de 1974 como auxiliar do Vasco

O Vasco não era o melhor time. Melhores eram Cruzeiro, Internacional… O Vasco conseguiu ganhar esse título em cima desses dois times muito bons. Tínhamos um time mais competitivo, não era o melhor, mas era um time de força. O Vasco, não sendo o melhor dos três, ganhou aquele título na força.

De auxiliar técnico a treinador

Fiquei até 1979 como auxiliar técnico. O Vasco tinha um presidente, o Agathyrno, o time estava muito mal, eu tinha acabado de voltar do Pan-Americano com a seleção brasileira. O presidente mandou todo mundo embora, inclusive eu que tinha acabado de voltar. Um vice-presidente até falou: “Mas o Lopes não tem nada com isso, ele acabou de voltar”, aí eu fui embora.

Em 1981 eu voltei como técnico principal. Em 81, disputamos aquela final que a gente tinha que ganhar três jogos porque o Flamengo estava com as vantagens. Ganhamos os dois primeiros, mas no terceiro jogo perdemos, com gol do Adílio e frango do Mazarope, a bola passa debaixo da perna dele.

Aí veio 1982, que eu me consagrei com o título, ganhando do Flamengo que era considerado um time de outro mundo. Era um timaço mesmo, lembro e falo que os bons times a gente guarda a escalação, e eu lembro até hoje a daquele Flamengo.

Foi minha consagração desbancar o Flamengo. Ali começou a minha marcha vitoriosa, com essa conquista e porque eu também barrei um monte de jogadores no triangular final. Com essa conquista eu fui embora, o pessoal passou a reconhecer mais o meu valor.

(Entre 1983 e 1996, Lopes passou por clubes como Flamengo, Fluminense, Internacional, Santos e Cruzeiro, além de ter treinado as seleções nacionais do Kuwait e da Costa do Marfim).

Não sei se é verdade ou mito, mas existe uma história de que você dava voz de prisão em campo…

Não, não… Isso aí é cascata. Isso foi quando eu estava no Internacional, teve um jogo no interior, teve uma confusão que eu gritei com o árbitro. Ele veio para querer me expulsar, aí eu me rebelei e disseram que eu ia prender o cara… Mas eu nunca me vali da minha posição de delegado para fazer qualquer coisa no futebol, sempre respeitei.

A volta para o Vasco em 1996

O Vasco estava sem grana nenhuma, eu peguei em 96 o Vasco mal, estava arriscado a cair, e aí começamos um trabalho. Mandei muitos jogadores embora, tinha jogadores fracos e comecei a fazer um trabalho ali, aproveitar os jogadores da base, Felipe, Pedrinho… E começamos a trazer alguns jogadores de fora que estavam desacreditados.

O Mauro Galvão estava na reserva do Grêmio, desacreditado, pegamos ele de graça, e também pegamos o Evair de graça no Atlético-MG. No campeonato estadual peguei uns jogadores de times pequenos. Nasa no Madureira, o Odvan no Americano, e fui botando esses jogadores mais experientes com os garotos da base. Formamos um time espetacular.

Além da briga entre Edmundo e Romário, tiveram alguns outros conflitos para você lidar no Vasco, como o Evair querendo sair…

O Evair queria sair porque troquei ele de posição com o Edmundo. O Edmundo era meia, né? Naquele campeonato de 97 que ele ganhou sozinho, fez muito gol. Então eu troquei ele de posição com o Evair, coloquei o Edmundo mais para a frente e recuei o Evair. Ele não gostou, esperou o campeonato acabar, pediu para sair e foi para a Portuguesa. Não ficou mágoa nenhuma, ele pediu para sair e eu deixei ele ir embora.

O Edmundo ganhou sozinho o Campeonato Brasileiro de 1997. Jogou muito, foi protagonista. Acho que foi ele quem ganhou aquele campeonato para o Vasco. Até hoje me dou bem com ele. Ele me chamava de pai e ainda me chama. Um cara muito legal.

Você fala de Romário e Edmundo, mas também trabalhou com Roberto Dinamite, outro ídolo do Vasco. Você manteve contato com ele antes da morte dele no ano passado?

O Roberto era um jogador excepcional, ele sabia tudo de futebol. O Roberto se tornou muito amigo. Ele estava no Vasco, o clube não estava utilizando ele, eu estava na Portuguesa, liguei para o Eurico e pedi o Roberto emprestado, e o Eurico me emprestou.

O Roberto já estava com uma certa idade, ele disse que queria ir, estava praticamente encostado no Vasco. Peguei o preparador físico e falei: “Olha, o Roberto não vai fazer preparo físico nenhum, ele está com uma idade avançada, o preparo dele vai ser todo com bola, a condição física que ele tem que ter é a bola que tem que dar”. Acertamos a parte física e ele arrebentou na Portuguesa. Ele foi morar no mesmo hotel que eu morava e peguei uma amizade muito grande com ele.

Eu já tinha uma amizade muito boa com ele, porque quando ele começou lá no Vasco eu já estava. E aí na Portuguesa ele arrebentou, fez muito gol. E nós fizemos uma amizade muito boa. Ele era um cara dócil, muito bom de lidar, um cara correto, muito humilde e, na época que ele estava com câncer, eu estava sempre com ele, ligando para ele, encontrando com ele.

Até que chegou um momento que ele falou que não tinha jeito. Mas era uma figura humana espetacular. Roberto era um cara muito legal, muito amigo e jogava pra cacete, não sei quem era melhor, ele ou Romário ou Edmundo. Ele fazia tudo, batia falta, pênalti, fazia tudo.

Se tivesse que formar um time tendo os três, o meu ataque seria esse. Romário, Edmundo e Roberto.

Pedrinho e Felipe

Foi fácil com Pedrinho e Felipe na época. Arrebentaram na base, eu subi com eles para o profissional. Era uma dupla boa, os dois trabalhavam pelo lado esquerdo, se entendiam bem. Puxei eles para o time de cima porque já estavam mostrando que seriam uma dupla que ia vencer e ia jogar bem.

Os dois fizeram muito pelo Vasco e agora podem fazer mais. O Pedrinho é muito inteligente, tem um bom nível, esperto pra caramba, acho que vai ajudar muito o Vasco como presidente. Já está mostrando isso. Uma dupla que conhece bem o Vasco. O Vasco precisava de pessoas que conhecessem bem o Vasco, e os dois conhecem. Acho que com os dois o Vasco vai progredir muito. O Edmundo também está sempre conversando com eles. Vez ou outra eles me ligam para conversar, mas não estou metido lá, não.

Relação com Eurico Miranda

– Sempre nos demos bem, me ajudou muito. Muitos títulos que o Vasco ganhou comigo a gente deve ao Eurico. O Vasco não tem hoje a representatividade que tinha na época do Eurico, todo mundo respeitava o Vasco, mais do que hoje. Quando ia montar a tabela do campeonato, ele chegava e falava os jogos que ele queria.

O que faltou na sua trajetória, que foi tão vitoriosa?

Título acho que faltou o Mundial contra o Real Madrid, em 1998.

E treinar a seleção brasileira?

Isso também. Estava no vestiário, o Athletico-PR ia jogar contra a Ponte Preta. Recebi um telefonema, era o Ricardo Teixeira me chamando para ir no sítio dele. Eu pensava que era para ser o técnico da Seleção, que estava sem treinador. Quando cheguei lá, ele disse: “Você vai ser o presidente da comissão técnica. É tudo contigo, você que vai escolher o resto da comissão. O futebol todo com você”. Pensei e falei: “Ah, vou ficar com isso mesmo para ver”. Eu pensava que era para ser o técnico da Seleção, mas era para ser o presidente da comissão técnica.

Sobre a Copa de 2002, o que aconteceu para o Romário não ir?

Aí eu não sei, o treinador era o Felipe, eu era coordenador do futebol. Eu levaria, mas eu não era o treinador, não mandava nada. O Felipe deve ter tido as suas razões, de não ter levado. Ele jogou antes, mas depois o Felipe disse que não precisava dele, mas até hoje ele não disse porque não quis levar o Romário. Até o Romário queria ir de qualquer maneira, pediu. O Ricardo Teixeira, presidente da época, pediu para levar o Romário, mas o Felipe não quis levar, mas nunca disse o porquê.

A campanha do Brasil na Copa América foi muito criticada por torcedores. Como você tem visto esse momento?

– É difícil avaliar de fora. Tem muita política… Acho que o futebol brasileiro está mal administrado, a formação das comissões técnicas que passaram por lá não foi acertada. O trabalho deles também não foi legal, faltou cabeça para escolher os jogadores. O Brasil continua tendo jogadores excepcionais, está aí o Vini Jr., o Rodrygo, então continua tendo bons jogadores. Acho que as comissões técnicas não têm trabalhado corretamente. É com relação à comissão técnica toda, acho que tem muita política, e futebol não pode se juntar com política. Alguns componentes foram escolhidos mais pela política do que pela competência.

Treinadores estrangeiros

– Continuo sendo contra a contratação de treinadores estrangeiros. Tem bons treinadores brasileiros, então por que contratar de fora? Um país que é pentacampeão do mundo, tudo com treinadores brasileiros, por que pegar um treinador estrangeiro? Eu sou contra. Está aí um monte de português, mas acho que ainda tem bons treinadores brasileiros.

Fonte: Globo Esporte

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