Rodrigo Capelo explica o plano do Vasco para equacionar dívidas

O Vasco da Gama é o primeiro a utilizar o RCE e pretende quitar pendências trabalhistas e cíveis em um prazo de até 10 anos.

Estádio de São Januário, casa do Vasco da Gama
Estádio de São Januário, casa do Vasco da Gama

Criado para estimular a migração do futebol para a Sociedade Anônima do Futebol (SAF), o Regime Centralizado de Execuções virou tábua de salvação até para quem não pretende fundar empresa.

Caso do Vasco. O clube carioca foi o primeiro a ter o direito de usar esse regime aprovado pela justiça, em agosto deste ano, embora não tenha demonstrado até hoje o interesse em constituir uma companhia.

O ge recebeu José Cândido Bulhões, vice-presidente jurídico vascaíno, no podcast Dinheiro em Jogo. Zeca, como é apelidado o dirigente, explicou como o clube pretende usar essa ferramenta para equacionar seu endividamento.

O que é?

O regime centralizado de execuções é um mecanismo que permite renegociar, de maneira unificada, dívidas trabalhistas (funcionários, atletas, técnicos) e cíveis (empréstimos, fornecedores, demais contratos).

Credores farão uma “fila” para receber seus créditos. Enquanto o clube de futebol, o devedor, dedicará parte de suas receitas mensais para fazer esses pagamentos. À medida que o tempo passa, a fila diminui.

Existe certa similaridade com o Ato Trabalhista, por causa da ordem de pagamento aos credores. Porém, o Regime Centralizado de Execuções abrange uma quantidade maior de dívidas, pois também inclui as cíveis.

Também há semelhança com a Recuperação Judicial, pois, nesse processo de renegociação, credores poderão conceder descontos para receber o dinheiro antecipadamente. No entanto, essa ferramenta não leva à falência. É uma “versão” mais branda, segundo advogados consultados.

Qual o prazo para o pagamento?

O devedor terá seis anos para cumprir o acordo feito com os credores. Esse prazo poderá ser esticado em mais quatro anos, desde que, ao fim do sexto ano, o devedor tenha pagado pelo menos 60% da dívida.

Quais os valores a renegociar?

No total, o Vasco tentará renegociar R$ 223 milhões em dívidas. A lista consta da petição inicial, enviada pelo departamento jurídico vascaíno ao Judiciário em agosto. A reportagem teve acesso ao documento.

De acordo com a natureza:

  • R$ 152 milhões – Dívidas trabalhistas
  • R$ 71 milhões – Dívidas cíveis

Em quantidade:

  • 255 processos – Dívidas trabalhistas
  • 70 processos – Dívidas cíveis

As dívidas incluem ex-jogadores e ex-técnicos com passagem pelo Vasco, além de outras menores com ex-funcionários. A maior parte diz respeito a temporadas recentes, mas há, em execução, dívidas que foram feitas no início dos anos 2000. O ge detalhou nomes recentemente.

Qual é a ordem de pagamento?

A legislação da Sociedade Anônima do Futebol (SAF), que instituiu esse mecanismo, estipula prioridade para alguns credores. A lista é a seguinte:

  • Idosos
  • Pessoas com doenças graves
  • Pessoas cujos créditos de natureza salarial sejam inferiores a 60 salários mínimos
  • Gestantes
  • Pessoas vítimas de acidente de trabalho
  • Credores com os quais haja acordo que preveja redução da dívida original em pelo menos 30%
  • Na hipótese de concorrência entre os créditos, processos mais antigos terão preferência

A linha sobre o desconto abre um entendimento a ser confirmado na Justiça. Como a lei fala em “pelo menos 30%”, é possível que descontos maiores obtenham prioridade no pagamento, o que faria com que o clube tivesse facilidade para abater parte maior das dívidas.

– Naturalmente, vão surgir dúvidas ao longo da aplicação, porque a gente não tem precedentes para se basear. “Pelo menos 30%” deixa a entender que a ordenação desses credores pode ser feita a partir do maior desconto. E é natural, faz sentido – explica Zeca Bulhões, vice jurídico do Vasco.

Quais os benefícios para o clube?

Uma vantagem está no “fluxo de caixa”. Hoje, no Ato Trabalhista, o Vasco precisa pagar um montante próximo a R$ 2 milhões por mês. É um desafio para um negócio que tem receitas sazonais.

Bilheterias são fracas no início da temporada; sócios-torcedores têm picos de adesão e inadimplência; direitos de transmissão do Campeonato Brasileiro são pagos de acordo com o calendário do campeonato; entre outras questões que facilitam ou dificultam o pagamento da quantia fixa.

No Regime Centralizado de Execuções, o pagamento está condicionado às receitas – 20% delas, todos os meses. Então, a pressão sobre o caixa cruzmaltino reduz em períodos em que a arrecadação é menor.

Outra vantagem está na suspensão de execuções e penhoras. Como o Vasco terá um acordo vigente com todos os credores, caso a proposta seja aceita, a possibilidade de ter receitas bloqueadas é reduzida.

Quais os riscos para o clube?

O Vasco precisará aumentar as receitas para dar conta dessa dívida. É verdade que o repasse variável – 20% sobre as receitas – coloca menos pressão sobre o caixa do que a quantia fixa do Ato Trabalhista, mas, como o acordo terá um prazo de seis a dez anos, a vida não será tão tranquila.

No plano que apresentou à Justiça, a diretoria vascaína oferece projeções para o fluxo de caixa em dois cenários: de acesso à primeira divisão já em 2021, com Série A em 2022, e de permanência na Série B em 2022.

Melhor Cenário para o Vasco
Melhor Cenário para o Vasco
Pior cenário para o Vasco
Pior cenário para o Vasco

Todas as fontes de arrecadação precisarão aumentar nos próximos anos, segundo os cálculos da própria diretoria de Jorge Salgado, para que o plano proposto aos credores seja cumprido.

Em 2021, no primeiro semestre, o Vasco registrou R$ 111 milhões em receitas. O clube conseguiu compensar parte das perdas por estar na Série B a venda de Talles Magno ao New York City.

De qualquer modo, as projeções mostram que o futuro não será fácil. Premiações só aumentarão se as performances na Copa do Brasil melhorarem. Mais jogadores precisarão ser vendidos. Receitas com sócios e marketing precisarão triplicar. E as bilheterias precisarão sair do zero.

O que acontece se o clube não pagar?

Zeca Bulhões, vice-presidente jurídico cruzmaltino, responde no podcast Dinheiro em Jogo. Qual é a punição que o Vasco estará sujeito se não cumprir as regras do Regime Centralizado de Execuções?

– É a volta das execuções. Elas voltam ao curso normal, conforme previsto na lei. Você tem um prazo máximo de dez anos. Se você estourar esse prazo sem conseguir quitar integralmente as dívidas cíveis e trabalhistas, as execuções voltam, e o clube volta a sofrer penhoras – explica o dirigente.

Fonte: Globo Esporte

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